Rio de Janeiro: chuvas em Teresópolis, Petrópolis e Nova Friburgo
1. Quase um ano após as chuvas causarem destruição e mortes em Angra dos Reis, no Sul Fluminense, as chuvas de janeiro causam novas tragédias no Estado, desta vez na Região Serrana: em Teresópolis, Petrópolis e Nova Friburgo.
2. Como dissemos há um ano, neste mesmo blog, o planejamento territorial é essencial para prevenir que as forças dos processos naturais não causem mortes e destruição de casas e pertences – sobretudo daqueles que têm muito pouco, ou quase nada.
3. Durante o ano as notícias foram de grandes “sucessos” de riqueza, investimento e progresso. Gostamos disso. Aí, acontecem as catástrofes. E os prejuízos são monstruosos ! O custo da reconstrução, das indenizações, e da recuperação dos negócios superam enormemente qualquer custo da prevenção.
4. A Constituição Federal determina que haja planejamento territorial, especialmente nas cidades. Ela também determina que haja preservação ambiental que, em última análise, tem como efeito minimizar as consequências dos acontecimentos naturais. A legislação ambiental e urbanística preveem diretrizes para o uso racional território: pois o seu uso excessivo, não sustentável, necessariamente acarretará não só prejuízos sociais, como naturais.
5. Mas os Planos Diretores continuam sendo aprovados sem levar isto em conta. Mas, a quem responsabilizar por isto? Nosso sistema jurídico não prevê qualquer forma de cobrança deste tipo de responsabilidade. Fica tudo a cargo da opção política: na escolha, pelo voto, do administrador (chefe do executivo), e dos legisladores (federal, estadual e municipal).
6. Ao fim e ao cabo, portanto, tudo é escolha nossa; da nossa sociedade: desde as opções pela feitura da lei, do seu conteúdo, dos critérios de aplicação, e até da pressão pelo seu cumprimento: pressão política, ou judicial.
Vale a pena ver de novo um vídeo sobre Angra; um ano após a tragédia de 2010 aqui, e reler os nossos comentários feitos à época:
“As consequências desastrosas sobre as pessoas, causadas pela maltratada natureza de Angra dos Reis, no litoral sul do Rio de Janeiro, continuam sendo objeto de notícias na mídia, e observações de leitores. Mas desta vez tem uma diferença: todos comentam que o desastre lá poderia ter sido evitado pela ação do planejamento urbano e ambiental, e pela FISCALIZAÇÃO do cumprimento destas regras.
Para que o planejamento funcione, pontos devem ser destacados:
1º – O planejamento territorial não é só de responsabilidade dos Municípios. Os Estados podem e devem também fazê-lo, em nível macro, para balizar o equilíbrio da ocupação urbana e rural regional. É o que diz a Constituição Federal no art.21, inc.IX, onde é estabelecido o paradigma para a ordenação territorial; e é também o que diz o Estatuto da Cidade, lei federal nº10257, art.4, inc.I e II. OS ESTADOS ATÉ O MOMENTO, DE MODO GERAL, SE OMITIRAM EM EXERCER A COMPETÊNCIA NORMATIVA DE REGULAR A OCUPAÇÃO TERRITORIAL.
2º – A competência de fiscalização da ocupação territorial é precipuamente municipal. Mas há também a competência estadual do licenciamento ambiental, e, sobretudo, nas áreas frágeis para abertura de novos loteamentos, ponto inicial de qualquer ocupação urbana. Há anos o Estado de São Paulo fiscaliza estas áreas frágeis, inadequadas à ocupação territorial, com base no art.13 da lei 6766/79, que dispõe sobre parcelamento do solo urbano. A omissão normativa em propor critérios estaduais, e nacional de ocupação territorial é um ponto crucial, pois sem prévia estipulação das regras não há como se exigir o cumprimento de obrigações, nem se exigir ação fiscalizadora, nem responsabilidades políticas ou funcionais dos agentes públicos.
3º – Qualquer ação normativa importa, necessariamente, em restrições de ocupação do solo. Não há milagres. Isto significa que não é possível fazer planejamento territorial liberando geral para uns, e restringindo total para outros. Daí a absoluta necessidade de uma visão de conjunto, que permita um equilíbrio geral da ocupação territorial, e um esquema de compensações. Veja, em Angra: foi dito que apenas 13% das áreas são planas. E o restante, o que fazer? Planejamento territorial parte de restrições, e não de liberações. Concordamos em fazer restrições de ocupação territorial, para buscar o bem de todos? Ou deixamos rolar, pois desastres, quem sabe, não acontecerão, … (e para que se preocupar com isto agora)?
4º – A introdução de “alavancas” de crescimento econômico e emprego, que podem trazer dinheiro para uns, não significa, necessariamente, desenvolvimento da qualidade de vida para todos (foi dito que em Angra, com a instalação de indústrias, o “Índice de Desenvolvimento Humano”, IDH, passou da 18ª posição no Estado, para a 36ª posição). Este desenvolvimento só vem se o dinheiro for usado para distribuir qualidade de vida; e isto é feito por regras preestabelecidas. A Verolme trouxe dinheiro para Angra nos anos 60, assim como a pavimentação da Rio-Santos. Mas os incentivos que estas “alavancas” trouxeram, não “pagaram” pela miséria que deixaram, pois dispensaram o planejamento geral em benefício de todos. A redistribuição dos lucros não vem de forma automática, ao contrário.
E esta história se repetiu em Macaé, e vai se repetir, se não houver planejamento territorial, no Arco Metropolitano, e, na CSA no Rio, e, por que não, nos equipamentos Olímpicos que tomarão conta do Rio para 2016.
Ou estamos, inocentemente e alegremente achando que não?
5º – O planejamento territorial, além de restrições de ocupação, impõe a previsão de disponibilidade de solo para população de baixa renda. Isto significa intervir para baixar o valor do solo urbano, tornando-o mais acessível a todos.
O programa “minha casa, minha vida” é meramente curativo, pois interfere em áreas já ocupadas basicamente, e não na pressão por novas áreas para ocupação. Neste ponto, o Ministério das Cidades não está fazendo o seu dever de casa, pois, através do Conselho das Cidades, poderia normatizar diretrizes gerais de ocupação territorial, e reservas de área para a população de baixa renda. Criar essa alternativa é essencial, e o mercado não o fará espontaneamente, como não o fez até agora.
Finalmente, necessário dizer, que toda cidade tem seu limite de ocupação para ser sustentável; e isto é informado pela qualidade de vida que queremos. Isto significa saber dar um limite ao crescimento de cada cidade. Qual é o da nossa cidade?
Certamente este não é o discurso dos prefeitos, mas pode começar a ser o nosso!