O Haiti é aqui?

 1.  Cheguei do Haiti ontem. Um país devastado. As consequências do terremoto ocorrido há sete meses ainda fazem parte do cotidiano dos moradores. Entretanto, ele foi apenas uma enorme pá de cal no desastre institucional e social que já vinha acontecendo naquele país.
 

 
2.  Muitas observações podem ser amadurecidas com a experiência de sentir, tão diretamente, o caos em que este país latinoamericano mergulhou.  É inacreditável ver que se pode sim, chegar a este limite.
 
3.  Um dos aspectos mais impressionantes ao circular por Port au Prince, capital do país, é a tomada completa dos espaços públicos pelos cidadãos sem teto. Supõe-se que 80% da população está desabrigada.  A capital tem três milhões de habitantes, e a carência habitacional do país é de cerca de 600 mil casas.
 
4.  Porém há terra, espaços privados vazios. O que não há é planejamento, e capacidade de execução de políticas públicas de redistribuição equitativa dos espaços privados.  O resultado é uma ocupação quase que total de ruas, praças, jardins, ex-prédios públicos. Calçadas não existem mais. Só há espaço para carros. Muitos carros, carrões.  A ocupação dos espaços públicos foi a solução imediata de quem chegou ao limite.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5.  A cidade, que é um território que pertence a todos, deve se impor, sobretudo, como espaço comum de desfrute democrático de todos os cidadãos, por meio da manutenção e conservação de seus espaços públicos, resguardados como uma riqueza coletiva: de ricos, de pobres, e da enorme classe média crescente.  Todos têm o mesmo direito à proteção e ao uso destes espaços.
 
6.  Cheguei no Rio e a manchete do jornal “O Globo” estampava o assédio dos grupos que tentam privatizar o espaço público do Jardim Botânico.
 
7.  Pelo fato de, por aqui, os governantes, até agora, não terem tido a coragem, a competência, e a decisão política de bancar, com efetividade e eficiência a geração de moradias para a população de baixa renda que se estende todas as partes da cidade do Rio, alguns funcionários federais, ocupantes de cargos de confiança transitórios, acham-se legitimados a impor, contra a lei, a privatização de bens públicos de uso comum do povo, e de uso especial! Preferem tapar o sol com a peneira, “à la haitiènne”, distribuindo a uns poucos privilegiados o que é de todos os outros!
 
Uma vergonha, essa incompetência de gerar políticas públicas de amplo acesso à moradia, e realmente abrangentes.  E, usando a pobreza de uns, tornar a Cidade ainda mais pobre dos seus bens coletivos de todos!  
A quem interessa tal dilapidação dos bens públicos?
 
 
 
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1 Resultado

  1. Til disse:

    A destruição da cidade de Porto Príncipe pelo terremoto em janeiro é uma das mais tristes tragédias deste ano. As catástrofes da natureza estão aumentando continuamente no mundo todo. Aqui no Brasil as enchentes em junho destruíram completamente as cidades alagoanas de Branquinha e Santana do Mandaú e diversos municípios pernambucanos foram gravemente atingidos. Além das catástrofes naturais temos também outro tipo de destruição quase cotidiana de nossas cidades. Nós que moramos no Rio, por exemplo, quase não reconhecemos a nossa cidade hoje. Quer dizer, reconhecemos, mas muita coisa da memória urbana foi apagada para sempre. A partir da década de 1970, a especulação imobiliária, a ignorância de políticos, e a ganância de certas construtoras e instituições destruíram edifícios históricos e logradouros públicos em nome do "progresso". Ficamos num silêncio que traduz nossa impotência. Talvez seja essa a resposta como na canção: “Pense no Haiti, reze pelo Haiti. O Haiti é aqui.”

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