Exercício de profissões e regulamentação pelo Estado

Dois casos à luz da Jurisprudência do STF
 

Nesta semana foram publicados dois julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da regulamentação profissional e controle estatal das profissões.

Embora distintos os casos, eles são importantes para uma discussão, fora da apreciação judicial, sobre como pensamos, enquanto cidadãos, a respeito do papel do Estado e das leis no que concerne ao controle e a intervenção no exercício das profissões e atividades.

O primeiro caso é relativo à exigência, ou não, do registro de músicos nos Conselhos Regionais da categoria  – Ordem dos Músicos do Brasil – para o exercício da profissão.

O segundo caso diz respeito a uma legislação do Distrito Federal (equivalente a uma legislação estadual), que criava e regulamentava, no âmbito daquele território, o exercício da profissão de motoboy.

No primeiro caso, o STF entendeu que o registro naquele Conselho profissional seria dispensável, não obstante haver uma lei federal regulamentando a profissão de músico (Lei Federal 3.857/60).

O STF entendeu, no caso, que o princípio constitucional do livre exercício das profissões é um direito fundamental, previsto na Constituição (art. 5º, XIII), direito este “quase absoluto“.  Ou seja, direito que a legislação ordinária somente poderia fazer restrições quando identificado o interesse público para esta regulação, de modo a exigir razoável e proporcional formação técnica ou de conhecimento.

 

No caso dos músicos, a exigência de certo conhecimento ou técnica, embora desejável, não poderia ser controlada através do registro, pelo Conselho Regional, já que a falta deste controle não causaria, necessariamente, dano a qualquer interesse público.

Ressalte-se que o interesse desta decisão acontece quando se discute, nacionalmente, a exigência da prova da OAB para o exercício da profissão de advogado. Ou seja, no caso dos advogados, nem se discute a exigência do registro do diploma de bacharel, por faculdade reconhecida pelo MEC, na Ordem dos Advogados do Brasil, conforme era feito há anos.

O que hoje se discute é se a OAB pode impor uma prova seletiva aos que já têm formação reconhecida por faculdade com funcionamento regular: uma prova de conhecimento aplicada por membros da categoria, e por ela escolhidos.

Interessante será ver como o STF se posicionará no caso da Ordem dos Advogados, e como aplicará os mencionados princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, em face ao critério da intervenção mínima para o exercício de qualquer profissão, em face da regra Constitucional do art.5º, XIII.

O segundo caso diz respeito à regulamentação legal feita pelos legisladores do Distrito Federal para o exercício da profissão de motoboy.

Neste caso, o STF nem entrou na discussão se haveria ou não interesse público de se regulamentar esta profissão. No caso dos motoboys, o STF julgou inconstitucional a lei distrital tão somente porque entendeu que regulamentar profissão diz respeito à área do direito denominada de “direito do trabalho”. E, como a Constituição Federal, nem seu art.22, I determina ser competência privativa da União legislar sobre “direito do trabalho”, estaria fora da competência dos legisladores distritais dispor sobre o assunto. 

Tendo em vista este julgamento, cabe somente à Câmara e ao Senado legislarem sobre o exercício da profissão de motoboys, se é que há interesse público em fazê-lo!

Muita centralização neste enorme país que se diz Federal, mas tem um coração unitário – até na leitura da lei pelo STF!

Aliás, é interessante voltar a discutir, não só na Justiça, mas na sociedade, quando é que há interesse público em se regulamentar o exercício profissional em face ao direito constitucional do livre exercício profissional…

Abaixo o resumo oficial das decisões.

 

ADI e relações de trabalho
Por considerar usurpada a competência da União para legislar sobre direito do trabalho e condições para o exercício de profissões (CF, art. 22, I e XVI), o Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta, proposta pelo Procurador-Geral da República, para declarar a inconstitucionalidade da Lei 2.769/2001, do Distrito Federal, que cria e regulamenta a profissão de motoboy.

ADI 3610/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 1º.8.2011. (ADI-3610)

 
Registro profissional de músico em entidade de classe – 3
 
A atividade de músico não depende de registro ou licença de entidade de classe para o seu exercício. Essa a conclusão do Plenário ao negar provimento a recurso extraordinário, afetado pela 2ª Turma, em que a Ordem dos Músicos do Brasil – Conselho Regional de Santa Catarina alegava que o livre exercício de qualquer profissão ou trabalho estaria constitucionalmente condicionado às qualificações específicas de cada profissão e que, no caso dos músicos, a Lei 3.857/60 estabeleceria essas restrições — v. Informativos 406 e 568. Aduziu-se que as restrições feitas ao exercício de qualquer profissão ou atividade profissional deveriam obedecer ao princípio da mínima intervenção – a qual se pautaria pela razoabilidade e pela proporcionalidade. Ressaltou-se que a liberdade de exercício profissional, contida no art. 5º, XIII, da CF, seria quase absoluta e que qualquer restrição a ela só se justificaria se houvesse necessidade de proteção a um interesse público, a exemplo de atividades para as quais fosse requerido conhecimento específico, técnico, ou ainda, habilidade já demonstrada.
 
RE 414426/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 1º.8.2011. (RE-414426)

 

1 Resultado

  1. Osnei Ribeiro disse:

    Se considerarmos que legitimidade é o reflexo do pensamento da maioria da população na sua estrutura jurídica e política, a federação brasileira é ilegítima. Os mestres, os jurístas,os especialistas, são minoria. Para a grande população brasileira, Lei é de Brasília. E quem manda é o Presidente.A decisão do STF pode até ser ilegal. Mas é legítima.
    Osnei.

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