Ilha do Raimundo, de Cleydson Garcia
Neste artigo, publicado na página do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá e de autoria do estudante de Arquitetura e Urbanismo Cleydson Garcia, um pesquisador apaixonado pela história do Rio de Janeiro, detalhes interessantes sobre a Ilha do Raimundo.
“Reza a lenda, que os carmelitas ou jesuítas compraram a ilha e fizeram nela um seminário ou casa de moradia. Os frades podem ter feitos túneis na ilha ligando-a à ilha vizinha de Forra Semanas (Santa Rosa), dando origem a “Lenda do tesouro na Ilha do Raimundo”, cita o autor.
Na segunda parte, o texto do professor Jaime Moares. Boa leitura !
ILHA DO RAIMUNDO
Por Cleydson Garcia
Desde as primeiras ocupações indígenas no entorno do “Recôncavo da Guanabara”, esta ilha e as demais, foram aproveitadas pelos tupinambás para buscar alimentos. A ilha tinha uma densa mata atlântica, e refletia o seu verde luxuriante, na piscosa Baía de Guanabara.
E este recanto, atraia os tamoios até a ilha para caçar com arco e flecha: robalos, paratis, piracanjubas, tainhas, pescadas, merotes, vermelhos e etc.
Após a conquista da cidade, a ilha passou a ser explorada por colonizadores. E aos poucos perdia a sua mata virgem, através de queimadas ou desmatamento. Teve dezenas de proprietários, ao longo dos séculos.
Nos princípios do século XVIII, a ilha era conhecida como “Ilha Cardozo”. Por volta de 1760, foi vendida para o Alferes Raimundo Ferreira da Silva, um militar! E seu posto atualmente, equivale ao de um tenente. A partir deste século em diante, o seu nome ficou perpetuado nesta ilha. E fora registrada nos domínios da Freguesia de Irajá.
O Sr. Raimundo possuía uma casa de vivenda coberta de telhas, senzalas, bananais, algumas árvores de fruto e quatro escravos de serviço. Lidava com a propriedade como se fosse um sítio insular no meio desta grande baía. Raimundo falecera um pouco antes de 1800, e sua viúva vende a propriedade para terceiros.
A Ilha do Raimundo tem cerca de 230 metros de diâmetro e possui uma baixa colina de 20 metros de altura. A sua praia, tinha uma estreita faixa de areia branca e de bom calado para embarcações como canoas, faluas e saveiros.
Reza a lenda, que os carmelitas ou jesuítas compraram a ilha e fizeram nela um seminário ou casa de moradia. Os frades podem ter feitos túneis na ilha ligando-a à ilha vizinha de Forra Semanas (Santa Rosa), dando origem a “Lenda do tesouro na Ilha do Raimundo”.
Ao passar dos anos, a lenda era contada de pescador a pescador, de pais a filhos. E a fama da ilha cresceu nas vizinhanças. A espera que um dia, alguém encontre uns baús repletos de ouro!
ILHA DO TESOURO – 1939
Por Jaime Morais
As histórias sobre tesouros escondidos sempre pertenceram ao imaginário popular, não sendo uma novidade o que foi divulgado em 1943, por alguns jornais da época, em relação a um tesouro escondido na Ilha do Raimundo.
No inicio dos anos 40, foi vasculhada por um grupo liderado pelo Coronel Albano Davi e os senhores Francisco Lamyn e Julio da Costa e Silva, que organizaram uma empresa que tinha por objetivo localizar um tesouro avaliado na época em 100 bilhões de cruzeiros, em barras de ouro, e pedras preciosas.
Em 1943, o grupo já havia investido cerca de 1 milhão de cruzeiros, tendo encontrado apenas algumas moedas antigas de prata e cobre e poucos objetos sem muito valor. Passado o tempo, o assunto veio a tona novamente, porém o Tesouro da Ilha do Raimundo continua desafiando a imaginação de muitos.
Texto e Pesquisa: Cleydson Garcia
Foto: Correio da Manhã / Ano: 1965
Fonte: Arquivo Nacional e Jornais Antigos.
A ANTIGA PENHA À BEIRA-MAR
Acredite, mas no passado a PENHA, bairro do subúrbio carioca, tinha sua orla marítima. Localizada nas terras da antiga Fazenda Grande da Penha, contava com praias, portos e até ilhas, como demonstram os mapas mais antigos do recôncavo do Guanabara.
Neste texto vamos falar do “litoral” da Penha, começando por SUAS ILHAS:
Entre a Penha e a Ilha do Governador haviam algumas ilhas, como a Pedra do Anel, Ilha de Forra Semana (atual Santa Rosa), Ilha de Jozé Gomes, Ilha do Boticário e a ILHA DOROTÉIA CARDOSA (atual Ilha do Raimundo), esta que era a principal e uma das duas que permanecem até hoje, não tendo sofrido com aterros.
A atual Ilha do Raimundo, foi por muito tempo chamada de Ilha DOROTÉIA CARDOSA, citada nos mapas do século XVIII e XIX como Ilha Cardoza (VER MAPAS EM ANEXO). Esses dois nomes faziam referência a personagens que foram dois dos muitos proprietários da ilha ao longo dos séculos. No século XVII a ilha pertencia a Sra. Dorotéia Cardosa. Já em 1760, após passar por sucessivos donos, a ilha chega as mãos de um português, o alferes Raimundo Ferreira da Silva. No final daquele século a Ilha é vendida por seu filho. Nos séculos seguintes surge a lenda sobre um tesouro escondido, que mecheu com cabeça do povo até o século XX. A lenda dizia que os jesuítas enterraram um tesouro na ilha, apesar de não haver nenhum registro histórico que comprove a presença dos jesuítas na região. Por conta da lenda, em meados do século XX ocorreram diversas incursões com escavações na ilha, no melhor estilo Indiana Jones. Nunca encontraram nada ou se encontraram, nunca saberemos.
Curiosamente a ilha está a venda atualmente por alguns milhões de reais, num anúncio que divulga seus 38 mil metros quadrados, ainda possuindo uma nascente de água e ruínas de outrora.
Abaixo, registros de fontes primárias onde estes personagens são citados.
Um registro de 03/06/1686 diz:
“Verba testamentária de Dorotéia Cardosa – Deixa a seu sobrinho Leandro da Costa uma ilha que tem, sita defronte de Manoel Fernandes Franco, e à sua sobrinha Maria de Galegos outra ilha que possui, que está defronte de Dom Gabriel [Garcez e Gralha]” (Arquivo da Curia Metropolitana)
Quando pesquisamos esses preciosos registros a fim de achar uma infomação, sempre somos brindados também com outras. Nesse caso, o texto também cita Manoel Fernandes Franco, que tinha um Engenho (chamado de N. S. da Candelária, da Ponta ou da Praia) na atual Ilha do Governador. Não é atoa que nos mapas antigos sempre observamos vizinho a Ponta do Galeão, a Ponta do Franco, desde séc. XVII (VER MAPA EM ANEXO), depois chamada de Ponta da Mãe Maria, já no séc. XIX.
Voltando a ilha primeiramente citada, em outro registro de 21/06/1760 diz:
“Escritura de doação de uma ilha que faz Pedro Fagundes Varela, escrivão da Intendência Geral, a Raimundo Ferreira – chamada de Dorotéia Cardosa, sita no recôncavo desta cidade, junto à Ponta do Galeão, que se acha cercada em roda do mar e fica fronteira à quinta que foi de Francisco Viegas Leitão e Souza, e que hoje é de sua mulher Dona Ângela de Mendonça, com casa de vivenda coberta de telha, várias senzalas, bananais, algumas árvores de fruto e 4 escravos de serviço, livre de foro, comprada a Pedro da Cunha e sua mulher Inácia Maria da Fonseca em 1/12/1756” (1° Ofício de Notas, livro 131, página 111v, disponível no Arquivo Nacional)
O SACO DO VIEGAS:
Observe que mais uma vez o registro nos trás informações da circunvizinhança, pois nele também é citada a esquecida quinta do Coronel Francisco Viegas Leitão e Souza (não confundir com Francisco Viegas da Fazenda do Viegas de Realengo), que é a antiga Fazenda Grande da Penha (também chamada de Fazenda de N. S. da Ajuda). Homem cujo nome deu origem ao antigo SACO DO VIEGAS, que era uma pequena enseada que se formava no litoral da Penha, dependendo da maré. Por isso essa enseada aparece em alguns mapas antigos, porém em outros só aparece uma pequena ilha próxima ao continente (COMPARAR DOIS MAPAS EM ANEXO). Já Dona Angela de Mendonça, esposa do Coronel Francisco Viegas, também citada na escritura, aparece como D. Angela em um dos mapas em anexo. Essa fazenda histórica merece um post futuro só pra ela.
Segundo uma antiga notícia, na região havia fartura de peixes, como merótes, paratis, robalos, tainhas, vermelhos, além de siris e até ostras. Era um maravilhoso balneário! Com toda essa fartura haviam muitos currais de peixes, onde hoje só se encontra lixo!
OS PORTOS DA REGIÃO:
Nos séculos XVII e XVIII haviam dois portos na região. O PORTO DE MARIA ANGÚ e PORTO DE N. S. DA PENHA.
O Porto de Maria Angú e a praia de mesmo nome, tiveram seu nome originado na ave mariangu, outrora abundante na região. Este porto servia para escoar a produção agrícola da região e durou do século XVII até o início do século XX. Sua localização original não se sabe ao certo, mas já no século XX ele ficava localizado na altura da atual Rua Pirangi de Olaria e passou a servir a passageiros que iam e vinham do Centro do Rio através das barcas.
Já o Porto de N. S. da Penha servia também para embarque e desembarque de passageiros, muita das vezes romeiros que vinham participar da festa de N. S. da Penha e seguiam por aquela que era chamada Estrada do Portinho (atual Av. Lobo Júnior). Em época de festas, o movimento deste porto era intenso, pois vinham visitantes de todo o antigo Rio de Janeiro!
No século XIX surgiu um terceiro porto, o Porto das Barcas, na altura da Rua Tenente Araquém Batista. Nesse porto chegava um ramal da E. F. Rio D’Ouro vindo de Vicente de Carvalho e servia para escoar diversos. Também recebeu romeiros e passageiros das barcas. A esta altura a Penha já abrigava o matadouro em parte das terras da outrora Fazenda Grande da Penha, mais precisamente onde hoje se localiza a Fazendinha (vizinha ao IAPI) e o Campo da Taninha, chamado pelos mais antigos de Campo da Boiada.
AS PRAIAS DA REGIÃO:
A região contava com duas famosas praias. A mais antiga, praia de Maria Angú e a Praia da Moreninha, esta assim chamada já no século XX.
A Praia de Maria Angú começava vizinha a Praia do Apicú em Ramos e vinha até próximo da atual Av. Lobo Júnior, onde então se inciava a Praia da Moreninha. A faixa de areia dessas praias era onde hoje passa a Av. Brasil, que é fruto de muito aterro. Os aterros também avançaram sobre o mar, onde hoje há diversas construções como a área militar, o mercado São Sebastião, a favela da Kelsons e etc.
Essas praias foram extintas, mas o nome Praia de Maria Angú posteriormente chegou a denominar a atual Praia de Ramos e também foi citado em alguns sambas:
“Peguei bolsa forrei a carteira
E me mandei pra praia de Maria Angú
Mas fiquei na intenção
Camarão tá caro pra chuchu” (Jovelina Pérola Negra)
Ou:
“Fui no bar da neguinha comer camarão
Na praia de Maria Angu
Tinha gente de todo lugar
Foi o maior sururu” (Beth Carvalho)
Esses são apenas pequenos fragmentos da esquecida história da região.
Destruíram nosso subúrbio praiano!
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*Texto, pesquisa e fotos atuais de autoria deHugo Delphim, publicados na Página O belo e histórico Rio de Janeiro.
*As fontes de pesquisa foram citadas no próprio texto. Também foi consultada a cartografia histórica.