1. O polêmico tributo chamado Contribuição de Serviço de Iluminação Pública (COSIP) ainda é objeto de disputas no Judiciário. Desta vez, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais teve sua decisão sobre a forma de sua cobrança, na conta de energia elétrica, “confirmada” pelo STJ. Esta forma de cobrança casada causou “revolta” nos contribuintes, já que para se ter luz em casa é preciso também que se pague a luz da rua, mesmo que esta última não exista, esteja com defeito ou apagada; ou ilumine somente os carros, e não os pedestres!
2. Fato é que esta forma de cobrança por ser duvidosa, foi inserida no próprio texto da Constituição por uma emenda constitucional, – a emenda nº 39 de 2002 que diz
“Parágrafo único: É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput [serviço de iluminação pública], na fatura de consumo de energia elétrica”. (art.149 -A)
3. Poder cobrar na fatura, isto agora parece ser indiscutível, em face do texto constitucional acima. A questão é como cobrar. E é isto que o Ministério Público, em Minas Gerais, questiona em uma Ação Civil Pública julgada pelo Tribunal de Justiça de Minas.
Nela o MP/MG entende, em função do direito do consumidor, ser necessário que a cobrança, na mesma fatura tenha dois códigos de leitura ótica: um para a energia individual, e outro para o serviço público, de modo que o consumidor possa ter clareza do que está sendo cobrado, e possa optar por pagamentos independentes! Muito bom! E está de acordo com que dispõe a Resolução nº 456/00, da Aneel.
A decisão do STJ diz:
“In casu, concessionária de energia elétrica cobrava, na mesma fatura, a contribuição de iluminação pública com a tarifa de energia elétrica, englobando-as no mesmo código de leitura ótica, sem dar oportunidade ao administrado de optar pelo pagamento individual, o que gerou a propositura de ação civil pública (ACP) pelo Parquet estadual. A Turma conheceu em parte do recurso e, nessa extensão, negou-lhe provimento, reafirmando a legitimatio ad causam do Ministério Público para ajuizamento de ACP em defesa de direitos transindividuais, no caso, a emissão de faturas de consumo de energia elétrica com dois códigos de leitura ótica, informando, de forma clara e ostensiva, os valores correspondentes à contribuição de iluminação pública e à tarifa de energia elétrica.”
Uma boa decisão e um bom começo na defesa dos direitos dos consumidores que, muitas vezes pagam o serviço sem a sua prestação adequada.
REsp 1010130 / MG
RECURSO ESPECIAL
2007/0280874-9
Relator(a)
Ministro LUIZ FUX (1122)
Órgão Julgador
T1 – PRIMEIRA TURMA
Data do Julgamento
09/11/2010
Data da Publicação/Fonte
DJe 24/11/2010
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE
ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ARTS. 81 E 82, DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. ART. 129, III, DA CF. LEI COMPLEMENTAR N.º 75/93. DIREITO CONSUMERISTA. COBRANÇA UNIFICADA DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA COM A TARIFA DE ENERGIA ELÉTRICA. COERÇÃO PARA O PAGAMENTO CONJUNTO. LEGALIDADE DA COBRANÇA DA CONTRIBUIÇÃO PARA CUSTEIO DA ILUMINAÇÃO PÚBLICA NA FATURA DE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DECIDIU A CONTROVÉRSIA À LUZ DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. SÚMULA 07/STJ.
1. O Ministério Público ostenta legitimidade para a propositura de Ação Civil Pública em defesa de direitos transindividuais, como sói ser a pretensão de emissão de faturas de consumo de energia elétrica, com dois códigos de leitura ótica, informando de forma clara e ostensiva os valores correspondentes à contribuição de iluminação pública e à tarifa de energia elétrica, ante a ratio essendi do art. 129, III, da Constituição Federal, arts. 81 e 82, do Código de Defesa do Consumidor e art. 1º, da Lei 7.347/85.
Precedentes do STF (AGR no RE 424.048/SC, DJ de 25/11/2005) e S.T.J (RESP 435.465/MT, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18.08.2009; REsp 806304/RS, PRIMEIRA TURMA, DJ de 17/12/2008; REsp 520548/MT, PRIMEIRA TURMA, DJ 11/05/2006; REsp 799.669/RJ, PRIMEIRA TURMA, DJ 18.02.2008; REsp 684712/DF, PRIMEIRA TURMA, DJ 23.11.2006 e AgRg no REsp 633.470/CE, TERCEIRA TURMA, DJ de 19/12/2005).
2. In casu, o pedido veiculado na ação coletiva ab origine não revela pretensão de índole tributária, ao revés, objetiva a condenação da empresa concessionária de energia elétrica à emissão de faturas de consumo de energia elétrica, com dois códigos de leitura ótica, informando de forma clara e ostensiva os valores correspondentes a contribuição de iluminação pública e à tarifa de energia elétrica, fato que, evidentemente, afasta a vedação encarta no art. 1º, parágrafo único, da Lei 7.347/95 (Lei da Ação Civil Pública).
3. A nova ordem constitucional erigiu um autêntico ‘concurso de ações’ entre os instrumentos de tutela dos interesses transindividuais e, a fortiori, legitimou o Ministério Público para o manejo dos mesmos.
4. O novel art. 129, III, da Constituição Federal habilitou o Ministério Público à promoção de qualquer espécie de ação na defesa de direitos difusos e coletivos não se limitando à ação de reparação de danos.
5. O Parquet sob o enfoque pós-positivista legitima-se a toda e qualquer demanda que vise à defesa dos interesses difusos, coletivos e sociais sob o ângulo material ou imaterial.
6. As ações que versam interesses individuais homogêneos participam da ideologia das ações difusas, como sói ser a ação civil pública. A despersonalização desses interesses está na medida em que o Ministério Público não veicula pretensão pertencente a quem quer que seja individualmente, mas pretensão de natureza genérica, que, por via de prejudicialidade, resta por influir nas esferas individuais.
7. A ação em si não se dirige a interesses individuais, mercê de a coisa julgada in utilibus poder ser aproveitada pelo titular do direito individual homogêneo se não tiver promovido ação própria.
8. A ação civil pública, na sua essência, versa interesses individuais homogêneos e não pode ser caracterizada como uma ação gravitante em torno de direitos disponíveis. O simples fato de o interesse ser supra-individual, por si só já o torna indisponível, o que basta para legitimar o Ministério Público para a propositura dessas ações.
9. Fundando-se o Acórdão recorrido em interpretação de matéria eminentemente constitucional, descabe a esta Corte examinar a questão, porquanto reverter o julgado significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Carta Maior, pertence ao Colendo STF, e a competência traçada para este Eg. STJ restringe-se unicamente à uniformização da legislação infraconstitucional.
10. O Recurso Especial não é servil ao exame de questões que demandam o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, em face do óbice erigido pela Súmula 07/STJ, sendo certo que, in casu, a questão relativa à necessidade de citação dos municípios para integrarem a lide, na qualidade de litisconsorte passivos, foi decidida pelo Tribunal local à luz do contexto fático-probatório encartado nos autos, mormente as disposições constantes dos convênios celebrados pelos municípios e pela empresa concessionária de energia elétrica, ora Recorrente, consoante se infere do excerto do voto condutor do acórdão hostilizado:”(…) No mesmo rumo, é de se rejeitar a preliminar de ilegitimidade passiva da Cia. Força & Luz Cataguases Leopoldina, já que, nos termos do convênio firmado com os Municípios, é ela quem procede à cobrança conjunta ora questionada, devendo, por certo, responder pela querela ‘sub judice’, razão por que também afasto tal preliminar (…)” fl. 352
11. Deveras, concluir sobre a documentação formal a ser exibida pela concessionária não interfere na relação jurídica que a mesma trava com os municípios, restando intocável o art. 47, parágrafo único do CPC.
12. In casu, a questão relativa à legalidade da cobrança da contribuição para custeio da iluminação pública na fatura de consumo de energia elétrica foi solucionado pelo Tribunal local à luz da exegese do art. 149-A, parágrafo único, da Constituição Federal, verbis:
“É bom salientar que após a publicação da EC nº 39/2002, ficou facultado ao Município cobrar a contribuição para custeio da iluminação pública na fatura de consumo de energia elétrica. Entretanto, entendo que a cobrança casada, agora constitucionalmente prevista, deve ser feita de tal forma que possa o contribuinte optar pelo pagamento unificado ou, ainda, pelo individual dos montantes.Daí por que se demonstra relevante a Resolução nº 456/00, da autoria da Aneel, na qual, a par de possibilitar a inclusão na conta da concessionária de energia, de pagamentos advindos de outros serviços, determina que, para tanto, sejam os consumidores consultados, para, livremente, caso queiram, optarem pelo pagamento conjunto e unificado. Nesse rumo, tem-se que não se discute no caso dos autos a consignação da cobrança da Taxa de Iluminação Pública, ou ainda, Contribuição para o custeio de tal serviço, com a cobrança da tarifa de consumo de energia elétrica, que inclusive foi autorizado pela Constituição Federal, o que se veda é tão-somente compelir o contribuinte a pagar, em conjunto, todo o montante da fatura, sob pena de corte no fornecimento de energia elétrica de sua residência, previsto em caso de inadimplemento da tarifa.O que se denota, portanto, é que a forma que a apelada vem emitindo a fatura de cobrança de energia elétrica afigura-se ilegal e abusiva, pelo só fato de impossibilitar os consumidores de optarem pelo pagamento da Contribuição de Iluminação Pública ou da tarifa de energia elétrica, sem que sejam compelidos a pagar, em conjunto, todo o montante.
Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Arnaldo Esteves Lima, Benedito Gonçalves (Presidente) e Hamilton Carvalhido votaram com o Sr. Ministro Relator.