Ocupação privada da Orla do Rio no Réveillon 2020: um caso para a Justiça de Brasília?
Por que a questão da extensão da ocupação privada dos quiosques nas das praias de Copacabana, Ipanema, Leblon e São Conrado no réveillon de 2020 foi parar em Brasília para ser decidida por um Ministro do STJ?
Foi legítima a alegação da decisão do Ministro do STJ de que, caso fosse impedida a ampliação do uso privativo extensivo das áreas públicas, haveria “a possibilidade de lesão à ordem e à segurança públicas, já que, na prática, fácil verificar que tal decisum poderá causar imenso tumulto em evento de enorme proporção“? (grifos nossos)
Vejamos os fatos :
Tudo começou quando, por decreto, o Prefeito do Rio autorizou que os quiosques estendessem suas áreas de ocupação no espaço público das calçadas e da areia das praias. Note-se que o referido decreto autorizativo só foi publicado no Diário Oficial do Município na sexta-feira, dia 20 de dezembro de 2019!
Então, foi a partir da segunda-feira, dia 23 de dezembro, antevéspera do Natal, que providências puderam ser tomadas pelos demais órgãos estaduais e federal que também zelam pelo patrimônio público das praias cariocas.
Foi o prazo entre os dias 23 e 31 de dezembro – aí compreendido o dia de Natal e o fim de semana de 28 e 29 de dezembro – que os órgãos da Prefeitura tiveram para receber e autorizar as referidas ocupações, e processar o pagamento (qual foi?) dos interessados; e que estes pudessem então contratar os serviços de ocupação dos espaços públicos adicionais.
E, para tal autorização, cada espaço seria individualmente delimitado por uma secretaria municipal, para que outra secretaria municipal pudesse calcular o pagamento, conforme o texto abaixo:
“art. 2º … e terão o seu perímetro de ocupação de área pública definido conforme as características de cada faixa de areia, o porte do quiosque e do evento autorizado, respeitado o limite de até duzentos e vinte e cinco metros quadrados, nem podendo vedar a visão do mar, antes e após a sua instalação e ocupação.
§ 2o Para efeito do disposto no § 1o, a delimitação do perímetro e a emissão de autorização para a realização do evento ficam a cargo da Secretaria Municipal de Envelhecimento Saudável, Qualidade de Vida e Eventos – SEMESQVE, e a fixação do valor e a cobrança da Taxa de Utilização de Área Pública – TUAP, ficam a cargo da Secretaria Municipal de Fazenda – SMF.”
Neste decreto não há qualquer menção à consulta aos órgãos de tutela ambiental ou de proteção ao patrimônio cultural!
Meio ambiente? Patrimônio Cultural?
Ora, são assuntos fora da órbita umbilical da Prefeitura do Rio, que sequer deu prazos razoáveis de planejamento e execução destes serviços. Ou já estava tudo acertado, e a publicação do decreto, em cima da hora, foi planejado exatamente para não permitir qualquer manifestação de outros órgãos, ou oposição?
Deu certo a tática do ataque surpresa à orla do Rio. Pois o Ministro mineiro se sensibilizou mais com a suposta “ordem pública” da economia privada dos quiosques do que com a ordem pública ambiental e da preservação do espaço público cultural tombado, e declarado patrimônio mundial!
Sim. Isto porque a decisão monocrática lá de Brasília, com argumento de “ordem pública”, e não de legalidade do decreto, revogou uma decisão de um desembargador vice-presidente de um Tribunal Federal em funcionamento no Rio, onde, obviamente, por estar mais próximo ao assunto e aos fatos, teria melhores condições de avaliação da situação.
A decisão do Desembargador Vice-Presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Messod Azulay, ao suspender a aplicação do precipitado decreto do Prefeito prestigiou a proteção ao meio ambiente, mormente num local público protegido internacionalmente pela UNESCO, e cuja ocupação estaria sendo permitida sem qualquer amparo em estudo de impacto ambiental ou de vizinhança.
Corretíssima decisão, consentânea com os princípios constitucionais, e infelizmente abatida em Brasília, com argumentos de “ordem pública (?)”, de um “tumulto” criado somente pela imprevidência do planejamento municipal.
E toda esta discussão só aconteceu por vontade e eficiência de um cidadão, Dr. Antonio Seixas que, mais ágil de que qualquer Ministério Público, federal ou estadual, propôs em nome próprio, a boa e antiga Ação Popular.
O fato já passou. A ação perdeu seu objeto. Será que ficou alguma lição?
Para mim ficou; a de que decisões monocráticas a serem tomadas em Brasília deveriam ser mais moderadas e respeitosas com as decisões dos Tribunais regionais e locais. Ou seja, mais respeitosas e condizentes com o federalismo judicial.
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