PENHA SOB PRESSÃO

O projeto de lei que altera o antigo PEU (Projeto de Estruturação Urbana) da Penha entrará hoje na sessão de votação da Câmara de Vereadores do Rio.

O projeto, dito como revitalizador da área, tem dois pontos estruturais: o aumento de gabaritos de altura e do potencial construtivo dos terrenos, e a eliminação da Área de Especial Interesse do entorno da Igreja Nossa Senhora da Penha, criada “para efeito de proteção das edificações e locais de interesse para o patrimônio cultural dos bairros”, conforme decreto em vigor.

O novo projeto de lei altera 80% do texto em vigor, ou seja, altera substancialmente o planejamento urbano da área, embora o seu texto seja quase ininteligível (Confira aqui), o que é, evidentemente, uma grave ameaça à sua aplicação, e um desrespeito ao cidadão, que deve ter na lei uma forma de leitura acessível dos seus direitos. Textos legais truncados e confusos são fontes certas de desafio à transparência dos direitos e das obrigações.

Alterando o planejamento da Penha e arredores, o projeto de lei proposto em 2010 bate de frente com o disposto nos arts. 68 e 69 do novo Plano Diretor da Cidade, aprovado em Fevereiro de 2011 pela própria Câmara. O projeto deveria ser um novo Plano de Estruturação Urbana para o bairro, já que modifica todos os anexos que contêm os parâmetros urbanísticos anteriormente fixados. Mas, como tal – como novo Plano – não apresenta nenhum dos conteúdos exigidos pelo art. 69 da Lei Complementar n.111/2011 – o Plano Diretor da Cidade (PD).

A Igreja da Penha foi o símbolo da Paz nas ações de pacificação da região. Desde 1988 é Área de Especial Interesse de proteção cultural e ambiental, não só do bairro, mas também da Cidade. Pelo parágrafo único do art.69 do PD, seria vedada sua alteração. Nem isto o novo projeto respeita, pois revoga sua área de proteção!

Se um novo planejamento para área é necessário e imperioso que ao menos se respeite o Plano Diretor da Cidade, e que se preveja como captar os recursos para os investimentos na infraestrutura urbana que o bairro tanto precisa. Sem isto, é inocência pensar que adensar é revitalizar. Para distribuir benefícios urbanísticos não podemos aprovar uma lei que, por enquanto, só contém dispositivos que privatizam os lucros e publicizam os custos.

Que se reveja o projeto de lei em prol da população, e em respeito ao que dispõe Plano Diretor! Sem isto, será legal aprová-lo?

Abaixo alguns pontos de perplexidade do projeto:

OBSERVAÇÕES GERAIS SOBRE O CONTEÚDO DO PLC 38/2010
 

a. O PLC modifica diversos artigos do Decreto 7654/88, substitui os respectivos Anexos, e revoga a maioria dos outros dispositivos legais originais;

b. O PLC acrescenta vários artigos novos usando numeração adicional (exemplos – art. 18-A, art. 18-B, art. 18-C, …até ao F!);

c. É detalhista quanto à ocupação dos terrenos e a arquitetura resultante, o que burocratiza a aprovação de projetos, a encarece e a elitiza.

d. Elimina a Área de Especial Interesse do entorno da Igreja Nossa Senhora da Penha, criada proteger a visibilidade do bem tombado municipal e proteger o patrimônio cultural da região;

e. Elimina a denominação ZE-10 (favelas), incorporada ao zoneamento geral, ao invés de criar Área de Especial Interesse para habitação social, protegendo seus habitantes de abordagens especulativas trazidas pela inflação do preço da terra, e por sua demanda, contrariando frontalmente o disposto no art.69, IV do Plano Diretor (PD).

f. Aumenta gabaritos de altura de modo geral e gabarito horizontal;

g. Aumenta gabaritos de altura especificamente (ver quadros de todos os novos anexos), dobrando o índice construtivo, afastada das divisas, da área do curtume carioca, privada, duplicando seu valor.

h. Garante novas isenções para o cálculo de ATE, inclusive de andares abaixo do meio-fio;

i. Isenta de taxa de ocupação e exige apenas taxa de permeabilidade;

j. Permite que as áreas de recuo sejam usadas no cálculo do potencial construtivo;

k. É menos restritivo quanto ao aproveitamento de terrenos regidos por zonas diferentes (avanço dos índices maiores) ;

l. Modifica as condições de parcelamento do solo significativamente;

m. Revoga explicitamente 37 dispositivos legais do Decreto 7654/88.

n.  Não indica diretrizes para proteção do meio ambiente natural e cultural, e à paisagem local (art.69, II do PD).

o.  Não indica os instrumentos para obtenção de recursos para os investimentos em obras públicas de infraestrutura na região, inclusive para sua alegada “revitalização” (art.69, V do PD).

p.  Não faz nenhuma reserva para áreas de habitação social, nem mesmo em áreas públicas, ou em extensas áreas privadas abandonadas, nem previsão de áreas de lazer, verdes, áreas de escolas, e outros equipamentos públicos, ou para infraestrutura urbana (inclusive viária), essenciais para o adensamento previsto do bairro.

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