Planejamento urbano em crise: o Estatuto da Cidade existe?
1. Por que esta engenharia social não funciona se há lei?
2. Vários têm sido os artigos publicados nos jornais, bem como declarações de autoridades, que falam sobre remoção de famílias de áreas de risco. Este tem sido o principal foco das críticas em relação aos últimos acontecimentos. Mas, remover para onde, se não há previsão de espaço territorial para tal?
3. Se é certo que isto tem que acontecer emergencialmente, é certo também que a ocupação das áreas de risco não é, definitivamente, a única responsável pelo desastre urbano acontecido na Serra Fluminense. A remoção servirá apenas para prevenir a morte certa destas famílias a curto prazo, o que não significa dizer que isto prevenirá a catástrofe nas cidades. O que causa não só as catástrofes, bem como a desqualificação urbanística e ambiental das cidades, é o mau planejamento, ou o nenhum planejamento.
Senão vejamos:
A Constituição Federal determinou (art.182 §1º) que as cidades de mais de 20 mil habitantes tivessem Plano Diretor, e o Estatuto da Cidade – Lei Federal 10.257/2001 – determinou diretrizes que estes planos deveriam seguir, dentre elas destacamos os seguintes incisos do art. 2º:
I – “garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura, ao transporte, e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.
IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sob o meio ambiente;
V – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:
a) Utilização inadequado dos imóveis urbanos;
b) A proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;
c) O parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infra-estrutura urbana;
d) A instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente;
e) A retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização;
f) A deterioração das áreas urbanizadas
g) A poluição e a degradação ambiental
VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica do Município e do território sob sua área de influência;
IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;
X – adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira e dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo a privilegiar os investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos bens pelos diferentes segmentos sociais;
XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a valorização de imóveis urbanos;
XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;”
4. Lei existe, portanto! Todas estas diretrizes do Estatuto da Cidade estão vigentes e, como lei federal que são, devem ser de aplicação obrigatória em todas as cidades brasileiras. Observância compulsória pelos Planos Diretores e legislação de uso e ocupação urbana dos Municípios, e pela administração pública municipal na gestão deste interesse coletivo. Reforçada pelos planos estaduais de ordenação territorial, que deveriam existir… (art.4º, I do Estatuto da Cidade).
5. Mas, será que podemos dizer que as cidades que sofreram o desastre urbanístico observaram estas diretrizes nacionais vigentes deste 2001, isto é, há mais de 10 anos!
6. Se não, por que os instrumentos de controle judicial não funcionam? Quem faz este controle? Quais são as punições?
Há algo de errado na eficácia desta engenharia? O quê?