Projeto de lei incentivará habitação no Porto do Rio ou só sacrifica o urbanismo?
Na última sessão ocorrida na Câmara do Rio, no dia 16 de julho (e agora, com o site daquela instituição finalmente no ar, podemos saber o que teria acontecido naquela reunião parlamentar) foi aprovado, em 2ª votação, o projeto de lei complementar nº 53/2013, que diz pretender incentivar a produção habitacional na área do Porto do Rio, codinome “Maravilha”.
Naquela semana, três outros polêmicos projetos de lei ocuparam mais os meus pensamentos: 1. o projeto de mudança de regras na escolha de conselheiros do Tribunal de Contas do Município (que foi aprovado), 2. a proposta de regras especiais para construção em área de preservação em São Cristovão (projeto não votado); 3. a já anunciada derrubada do veto do Executivo ao projeto de lei que conferia benesses olímpicas para hotéis no Rio (o que aconteceu).
No entanto, não dei tanta importância a um quarto projeto de lei, também votado naquela obscura sessão da Câmara do Rio: exatamente aquele que conferia benesses urbanísticas na área portuária. Contudo, dois artigos nesta semana fizeram minha atenção voltar a este tema: o artigo publicado no blog UrbeCarioca e o editorial publicado no Jornal “O Globo” em 27.07.2014. E foi um espanto!
Reler o projeto de lei para começar foi árduo. Não é para leigo, não é para o povo, não é didático; e é dificílimo entender do que se trata. Confesso que ainda não entendi tudo, mas posso aqui, ao menos, falar sobre o que eu não entendi.
1. Não entendi como se atribui ao projeto de lei a função de incentivar a produção habitacional na área do Porto se o que a proposta faz é “desregulamentar” exigências construtivas para prédios habitacionais. Ora, é vasta a literatura acadêmica no sentido de que não é a desregulamentação de padrões básicos o elemento nem necessário, nem suficiente para incentivar a produção. O mercado sim, pode ser a razão. O que estará acontecendo no mercado na área? Por que os anunciados prédios com o dinheiro da Prefeitura não deslancharam?
2. Também não é explicado qual o setor de produção habitacional que será incentivado, já que é também vastamente sabido que para algumas faixas de habitação o mercado não precisa de incentivo, enquanto que para outras – especialmente para a faixa de 1 a 6 salários – incentivos nunca serão suficientes, pois esta uma faixa fora do mercado.
Portanto, a afirmação vago genérica da ementa da lei (incentivar a produção de habitação) pode ser apenas um indício de uso indevido desta justificativa para tentar legitimar uma significativa alteração do padrão construtivo na área, especialmente para conjuntos residenciais multifamiliares, o que é lamentável.
3. A “desregulamentação” proposta para incentivar o mercado é de duvidoso interesse público, pois a pergunta que se faz é: se os padrões urbanísticos construtivos pré-estabelecidos são o mínimo necessário para se garantir interesses públicos relevantes, como áreas e serviços públicos, iluminação, drenagem, sustentabilidade ambiental interna e externa, como e por que sacrificar estes padrões para incentivar a produção de mercado habitacional? (se é que incentiva…). Se os padrões de qualidade construtiva interna e externa para a área não eram necessários, por que foram estabelecidos? Então, repita-se a pergunta: pode-se sacrificar padrões de interesse público, estabelecidos para as construções na Cidade para se “incentivar” o mercado privado?
A resposta legal, ao menos na teoria, é não. Nem legal, nem legítimo.
3. Finalmente, para não me alongar em um tema que sei que é inesgotável, a pergunta que não quer se calar: se é a Caixa Econômica Federal, através de um fundo imobiliário criado com dinheiro dos trabalhadores (FGTS), que é dona de todos os CEPACs (dona de todo o potencial construtivo na área, que a Prefeitura lhe vendeu na totalidade), e se a CEF é o banco da habitação no Brasil, não caberia tão somente a ela estar usando os CEPACs para incentivar a habitação na área, especialmente a habitação social?
E mais: qual o sentido do art.10 do projeto de lei 53/2013 quando diz:
Art. 10. As edificações residenciais e a parte residencial das edificações mistas ficam isentas de pagamento de contrapartida em caso de outorga onerosa do direito de construir e de alteração do uso, enquanto perdurarem os incentivos e benefícios previstos nesta Lei Complementar.
Juro, não entendi: isentas de quais contrapartidas? De CEPACs? De pagar por elas?
Mas, elas – as CEPACs – não são da CEF? Se são, pode a Prefeitura, a pretexto de incentivar as imobiliárias, alterar as regras econômicas do mercado de CEPACs, isentando de pagamento das contrapartidas CEPACs, que, pela lei são a representação da outorga onerosa do direito de construir? É isso que está dizendo a frase,quase ininteligível? Mas, se a Prefeitura já alienou tudo, embolsou todo o recebido, repassou quase tudo ao Consórcio construtor Porto Maravilha ….
Ficarei grata, com sinceridade, a quem puder me explicar melhor como funcionará e que fins se pretende alcançar, e quando. Com a palavra, a equipe técnica responsável por esta proposta. Afinal, é da maior responsabilidade sacrificar o bom urbanismo da cidade em nome de duvidosos e rendosos incentivos a imobiliárias. Por isso é legítimo que se dê-se nomes aos “bois”.
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Caro Jorge Duarte. Pode ser. Mas, por enquanto é só notícia de jornal. De concreto só torres comerciais. Aguardemos pelo melhor. Abs. SR
O que li no Jornal Extra: Que a Prefeitura entregará a área urbanizada, inclusive com os VLTs, para a construção de 28 mil imoveis, para todas as classes sociais, o que tornará a atual área decadente num novo bairro, gerando empregos e impostos. Acredito que seja bom…