Terras Públicas: por que cedê-las?

É legítimo a Cidade do Rio ceder terras públicas à empresa privada internacional?
 
Em que condições?
 
Encontra-se em processo de votação na Câmara de Vereadores o projeto de lei 1110/2011, no qual o Executivo pede autorização ao Legislativo para dar em concessão real de uso, à General Electric do Brasil Ltda, uma área de 5 hectares de terras públicas (cerca de 50 mil m2), na Ilha do Fundão, na Cidade Universitária, pelo período de 50 anos, prorrogável por mais 50: ou seja, um século !

 
Sendo um direito real, equivale, em todos os seus efeitos jurídicos, a um título de propriedade da área.
 
Esta concessão de terras públicas, que hoje pertencem à União, e estão sendo negociadas pelo Município sem qualquer informação de seus custos, faz parte de um pacote de benefícios, nos quais se incluem também isenções fiscais àquela empresa para que ela instale ali um Centro Tecnológico, e de Treinamento, de acordo com um Termo de Compromisso que teria sido firmado entre o Executivo municipal e aquela empresa americana de capital limitado.
 

Temos, no Brasil, uma lamentável tradição em termos de benefícios fiscais e fundiários; e há fartos estudos sobre a facilidade de como eles são concedidos, e a dificuldade de fiscalizá-los, posteriormente. 

O recente caso da Companhia Siderúrgica do Atlantico (CSA) comprova isto: isenções e poluição, tudo devidamente aprovado no legislativo. 

 
A questão é, sobretudo, a forma de como é feita a conta de custos públicos e dos benefícios coletivos.
 
Mais uma vez, a conta não é encaminhada à Câmara de Vereadores para deliberação e, infelizmente, apesar de ter sido objeto dos debates, apenas quatro vereadores votaram, ontem, em 1ª votação, contra o projeto (eu inclusa, evidentemente), por absoluta falta de informações.
 
A questão não é não dar, mas como dar: e isto faz toda a diferença!
 
Senão vejamos:
 
 
– No projeto, singelo, não está esclarecido nenhum tipo de encargo que a empresa terá por tamanhos benefícios, pois o Executivo Municipal nem se deu ao trabalho de encaminhar à Câmara o Termo de Compromisso que assinou com a empresa.
 
– Não há nenhum esclarecimento sobre o valor desta propriedade fundiária que está sendo dada  – uma fazenda no centro do Rio: quanto vale o terreno, e quanto vale esta concessão de direitos fundiários de terras públicas à empresa internacional, por cinquenta anos, e + cinquenta.  Gratuito?  Há encargos?  Há remuneração?  Quais os compromissos em termos de benefícios públicos?
 
Como será a instalação do Centro Tecnológico, quais os custos, quais os compromissos de passagem de tecnologia e registros de patentes no Brasil, para que possamos garantir o domínio tecnológico, e por isso justificar, minimamente, tamanhos benefícios fundiários públicos?
 
Como e por que foi escolhida esta empresa?  Foi feita uma oferta pública para outras empresas, inclusive nacionais?
 
Como ela se encaixa no projeto tecnológico do Campus Universitário do Fundão e da UFRJ?  Quem foi ouvido?  
 
Quais os estudos técnicos de custos públicos x benefícios sociais para tamanha gratuidade?
 
Estas são perguntas elementares, que deveriam ser parte de uma preocupação mínima antes de autorizar gratuidades públicas, que se repetem há séculos, em uma cultura de submissão que acredita que, se o poder público não der a alma, as terras, o grande investidor estrangeiro não investirá no País, ou na Cidade. 
 
Se a Cidade é tão boa, por que não investiria?
 

Duro é ver que a dita “base” de esquerda, e a do “povo”, na Câmara de Vereadores, ainda acredita neste discurso patrimonialista e neocolonial !

Confira, abaixo, quem votou a favor e quem votou contra o projeto:


Votaram SIM: Vereadores Adilson Pires, Alexandre Cerruti, Aloísio Freitas, Argemiro Pimentel, Carlinhos Mecânico, Carlos Bolsonaro, Dr. Eduardo Moura, Dr. Jairinho, Dr. João Ricardo, Dr. Jorge Manaia, Elton Babú, Israel Atleta, Ivanir de Mello, João Mendes de Jesus, Jorge Braz, Jorge Pereira, José Everaldo, Leonel Brizola Neto, Marcelo Arar, Márcia Teixeira, Patrícia Amorim, Paulo Messina, Renato Moura, Roberto Monteiro, Rubens Andrade, S. Ferraz, Tânia Bastos e Tio Carlos (vinte e oito)

Votaram NÃO: Vereadores Eliomar Coelho, Paulo Pinheiro, Sonia Rabello e Teresa Bergher (quatro).

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2 Resultados

  1. Osnei Ribeiro disse:

    Vereadora:
    Sou seu fã.Gosto muito de sua participação nos debates da Câmara. É preciso lembrar ao Presidente que ele não pode aparteá-la da Mesa.
    Quanto a esse caso, o maior absurdo é o Projeto prever que a concessão será nos termos do §2º do art. 1º e depois no parágrafo único do art. 2º dizer que o referido parágrafo não precisa ser obedecido. É o samba do crioulo doido.
    Osnei.

  2. Sergius disse:

    A distorção da medida é tamanha que caberia um embargo da decisão pelo governo federal.
    A Ilha do Fundão é patrimônio da União e não compete ao legislativo municipal deliberar sobre concessões.
    Como dito em seu artigo, vivemos sobre a égide das concessões e não pelo estímulo ao empreendedorismo saudável e viável.
    Paternalismos e clientelismos, por si só, denotam a inviabilidade das pretensões e caracterizam os aspectos obscuros das transações, quando não explicitada claramente sua inserção em um programa pré-estabelecido pelo executivo.
    A empresa em questão é bastante madura e poderosa para empreender sem favoritismos, em qualquer parte do mundo.
    Essa atitude é decorrente de falta de um programa de desenvolvimento devidamente estudado e da falta de um planejamento estratégico de longo prazo sério e honesto, de exclusiva responsabilidade do poder executivo.
    Basta, portanto, que a Câmara Municipal do Rio de Janeiro esteja isenta de interesses menores e questione os reais motivos da dita concessão, arguindo ao executivo sobre os fundamentos técnico-científicos, estratégicos e programáticos de desenvolvimento, que originaram tal decisão.
    Levando-se em conta as reais necessidades, a falta de perspectivas e planejamento do Estado e o benefício de tal empreendimento para o povo e estará evidente que tal deliberação é unilateral e somente interessará, de forma escusa, a mais um grupelho que se serve do poder, ao invés de servir-lhe.

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