Operação Urbana de Niterói: um negócio de venda do patrimônio urbanístico da Cidade
A proposta legislativa PL 193/2013 encaminhada pelo Executivo à Câmara Municipal de Niterói (CMN) não é uma proposta urbanística para a cidade.
É uma proposta de captação financeira de recursos a serem obtidos pela venda da totalidade do potencial construtivo edificável da área central da cidade, através de títulos mobiliários, denominados CEPACs – Certificados de Potencial Adicional de Construção.
Esta é a conclusão elementar que qualquer um pode chegar pela simples leitura do projeto de lei enviado à CMN em regime de urgência.
Sem precisar de qualquer análise mais profunda, percebe-se que o texto do projeto de lei não prevê qualquer plano urbanístico para a área do Centro da cidade, onde se pretende implantar o regime de “Operação Urbanística Consorciada” (OUC), que é um instrumento de planejamento urbano complexo, previsto no Estatuto da Cidade (lei 10.257/2001), nos artigos 32, 33 e 34.
E ele, em tese, só poderia ser usado dentro das diretrizes previstas no Estatuto da Cidade e dentro de uma previsão de ordenamento urbano do Plano Diretor da cidade onde se pretende implantá-lo.
Ocorre que em Niterói a proposta de implantação da OUC, conforme prevista no PL193, nem atende às diretrizes do ECi, nem do Plano Diretor. E por quê?
Não atende ao Plano Diretor de Niterói porque, simplesmente, este não foi revisto, como determina o parágrafo 3º do art.40 do Estatuto da Cidade. E sem um Plano Diretor que estabeleça os pressupostos urbanísticos de integração dos serviços públicos e da qualidade de vida da cidade, como se poderia então realizar uma OUC em sua área central – a mais nobre e mais cara?
Descumprimento direto e indireto
Se Niterói ainda não cumpriu a tarefa de rever seu Plano Diretor, na forma prevista no ECi, esta OUC estaria também descumprindo, direta e indiretamente o próprio Estatuto da Cidade, lei federal de direito urbanístico.
Infelizmente o novo chefe do Executivo da cidade de Niterói está, com o PL 193/2013, tomando como exemplo o caminho tortuoso da lei carioca que instituiu a OUC do Porto Maravilha.
Quase tudo copiado: a proposta de criação de uma empresa de economia mista para acompanhamento da OUC, a autorização para se licitar um consórcio urbanístico privado para as obras públicas e prestação de serviços públicos locais com dinheiro da OUC e a alteração dos índices de edificabilidade no local, aumentando o gabarito da área.
Com um detalhe: no PL niteroiense a previsão de obras a serem realizadas é muito mais pífia do que a do Rio: sem orçamentos, sem condicionantes e sem programação. É de “corar” qualquer gestor!
Será que o governo do PT de Niterói estaria também negociando com a CEF o uso do FGTS para a compra do patrimônio construtivo da área central da cidade, conforme feito na Operação do Porto Maravilha?
Seria então mais vergonhoso, dado o momento atual que estamos vivendo. Mas, se a CEF fez esta cortesia com o governo municipal do PMDB do Rio, por que não fazer com o governo do PT de Niterói?
Pode-se esperar portanto que, caso a Câmara de Niterói se veja na contingência de ter que aprovar este negócio urbanístico para o centro de Niterói, o consórcio de empreiteiras*(1) vencedoras da licitação que administrará as obras e serviços do centro de Niterói seja bem parecido com o consórcio de empreiteiras que já administra a área central portuária do Rio, pelos próximos 20 anos. Só atravessarão a ponte.
E se tudo se passa assim, sem plano, sem planejamento, por que não é questionável em face à lei federal?
Simplesmente pela enorme dificuldade não só dos leigos, como também dos operadores do Direito e da Justiça de avançar na decisão da suspensão da eficácia de uma lei que descumpre as diretrizes contidas no Estatuto da Cidade. Lei e diretrizes legais temos. Falta decisão de aplicá-las.
Com isso, o interessante instrumento das Operações Urbanas Consorciadas, que veio para financiar um planejamento urbano mais equitativo e socialmente justo, está sendo tão desvirtuado pelos governos, que os urbanistas já começam a questionar a sua proficiência para o bem da Cidade. Infelizmente…
Consórcio Porto Novo (do Rio) é formado pela empreiteiras: Odebrecht, Carioca Engenharia e OAS Engenharia.
O Núcleo Leste Metropolitano do IAB-RJ registra e agradece a importante contribuição que a professora Sonia Rabello, ex-vereadora do Rio de Janeiro, tem dado ao debate da Operação Urbana da Área Central de Niterói, alertando para todos os problemas do projeto de lei em tramitação na Câmara Municipal