“Picotando a Perimetral (e imobilizando o Rio)”

Neste artigo, o cientista social Guina Ramos comenta sobre a predominância da fragmentação das vias (e das vidas) na “organização” urbana do Rio de Janeiro, os argumentos apresentados e as motivações inconfessadas para a demolição da Perimetral, destacando que não trata-se apenas da questão de manter o Elevado a todo custo, mas de “não imobilizar o Rio de Janeiro a um custo altíssimo…”.

Artigo “Picotando a Perimetral (e imobilizando o Rio) originalmente publicado no Blog RioGuina

“Uma equipe de ladrões altamente técnicos picotou (para roubar) as vigas já retiradas da Perimetral, que querem derrubar…

É sintomático que o prefeito tenha guardado, como um troféu, um pedaço do aço da Perimetral em sua própria casa (ou melhor, a casa em que mora enquanto prefeito, paga pelo povo carioca). Deve sentir-se engrandecido ao reconhecer-se na função de destruidor de patrimônios da cidade, escolhendo uma amostra de aço dessa obra (de destruição) como autoassumido prêmio simbólico, que deve estar ganhando também os concretos…

Já que na `organização´ urbana do Rio de Janeiro predomina a fragmentação das vias (e das vidas), façamos (enquanto mais este crime não é perpetrado) algumas observações sobre os argumentos apresentados e as motivações inconfessadas…

A demolição da Perimetral e a construção das via Expressa e Binário, segundo Fernando MacDowell, especialista contratado, dará não mais que 27% de aumento na capacidade do sistema viário (mas o dado é contestado pelo Ministério Público, e há previsão de aumento do tráfego).

A Via Binário terá pontos de retenção, desaceleradores da velocidade dos carros, com mudanças de direção em ângulo de 90º (vide mapa), enquanto a Via Expressa colocará o tradicional engarrafamento da Perimetral em um túnel de 3km, uma loucura!… 

[Espera-se que a paisagem perdida seja pintada nas paredes…]

A extensão do túnel até o início do Aterro do Flamengo foi uma decisão pessoal do prefeito e a Prefeitura (o carioca!…) vai pagar por isto. No entanto, `Paes acredita que a despesa possa ser amortizada com a venda do concreto e do aço que sobrarem do desmonte´… Dá pra acreditar?…

Retirar o elevado da Perimetral por razões estéticas, para agradar os mandarins do futuro `território dominado´ do Porto `Maravilha´, é uma deturpação das tarefas da prefeitura. Basicamente, pretende-se liberar `o visual´ dos projetos arquitetônicos do capital internacional (as `Torres´) e dos negócios do seu `departamento de publicidade´, a imprensa laudatória local (não por acaso, os museus do Mar e do Amanhã, são destaques nas apresentações oficiais).

Todo este `investimento em destruição´ será pago pela prefeitura do Rio (R$1,5 bilhão de custo para a derrubada da Perimetral, mais do que foi gasto no Maracanã superfaturado!). É uma espécie de `Lei dos Ganhos Privados´: os gastos (ou custos) são sempre do poder (e, portanto, do próprio) público…

E por que apenas esta demolição específica, entre tantas?…

No Rio de Janeiro, há dezenas de exemplos de elevados, viadutos, passarelas, pontes e outros objetos urbanos que, para seguir o mesmo critério, deveriam ser demolidos.

E, apesar de ser um xodó do urbanismo atual, espaços amplos, esplanadas vazias, como seriam a Praça XV e o contorno do morro de São Bento, transformam-se, sob o sol tropical, em desertos…

E a questão da mobilidade, este sofrimento cotidiano?… Qual é o plano de transporte de massa para o Porto `Maravilha´?… Até agora, os ônibus de sempre e o VLT, praticamente um veículo de passeio, integrados aos demais modais. Em termos de transporte de massa, isto não é integração, é fragmentação…

Já foi proposto o aproveitamento da Perimetral para o BRT TranBrasil, em que o BRT passaria pela borda da cidade e o usuário completaria a viagem no VLT.

Ora, ao estilo do método patético que governa o Rio, por que não inverter a proposta e fazer com que (enquanto fica a Perimetral para os carros) o BRT TransBrasil, em vez de seguir pela Av. Pres. Vargas, passe pelas Vias Binárias?…

Afinal, não é questão de manter a Perimetral a todo custo. É de não imobilizar o Rio de Janeiro a um custo altíssimo…

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