Ilha do Fundão: planejamento urbano exclusivo? Uma história para contar e lembrar
Em 2011, quando a Prefeitura do Rio resolveu doar, por concessão real de uso (por 50 + 50 anos), à General Electric, cinco hectares de terras – (48 mil m²) na Ilha do Fundão, para que aquela multinacional lá construísse o seu Centro Tecnológico, apresentou-se um problema de planejamento urbano. Aquela gleba de terra urbana da Ilha de Bom Jesus não estava destinada à construção nenhuma; logo a Cidade não tinha previsto qualquer índice construtivo para a área.Precisava-se urgentemente, portanto, que houvesse previsão urbanística de planejamento por lei, para que o projeto de construção, pela GE, naquela ilha pública, histórica e paradisíaca pudesse se concretizar.
O que aconteceu então?
A Prefeitura enviou então o primeiro projeto de lei, com índices urbanísticos, para toda a área da Ilha do Fundão. Sim, porque a chamada Ilha de Bom Jesus, antes uma ilha, havia sido aterrada para formar um todo com a Ilha do Fundão, doada pelo Governo Federal à UFRJ. E porque toda aquela gleba de terras era pública – da UFRJ e da União (ocupada pelo Exército, na ilha de Bom Jesus -, nunca o Município do Rio de Janeiro se tinha se preocupado em fixar índices construtivos para aquela enorme área da Cidade.
Uma curiosidade nesta história é que, contam, que quando a UFRJ começou a destinar partes do seu campus a construções não universitárias, como o Centro de Pesquisas da Petrobras, apresentou-se o problema de como aprovar, na Prefeitura, aqueles projetos ! Com quais parâmetros urbanísticos, já que tais prédios não faziam parte do complexo universitário?
Que jeito deram, não sei. O que sei é que, até hoje, a gleba de terras da Ilha do Fundão que pertence à UFRJ não tem qualquer índice construtivo público, aprovado pela Câmara da Cidade, como acontece com qualquer parte do território do Município do Rio.
Pela letra da lei, se não há índices construtivos públicos, não há como se aprovar projetos construtivos na Prefeitura. Não importa quem seja o proprietário das terras: públicas, privadas, de embaixadas, da Igreja, dos santos, etc.
Mas quando o primeiro projeto de lei urbanístico para toda a ilha do Fundão foi apresentado na Câmara Municipal, as autoridades superiores da UFRJ não se conformaram. Queriam que o campus não fosse objeto de regulação urbanística pela Prefeitura, argumentando que eles tinham um plano diretor próprio. Plano diretor este que não foi, e não é, até hoje, aprovado pelo procedimento legislativo municipal ordinário, como manda a Constituição Federal e o Estatuto da Cidade! É um plano feito por eles, à parte do planejamento geral da Cidade como um todo.
“Área funcional” – O campus da UFRJ, pela legislação municipal, é considerado “área funcional”. Tudo que lá se constrói, portanto, se faz à revelia de uma lei de planejamento da Cidade. E isso acontece com uma universidade que tem centros especializados onde se ensina planejamento urbano !
Assim, quando o primeiro projeto de lei foi apresentado à Câmara, junto com a proposta de “doação” das terras públicas à GE, as autoridades da UFRJ marcaram uma reunião com os vereadores, na qual estive presente como tal. Minha esperança era a de que as autoridades da UFRJ se juntassem ao meu anseio de não “doação” da enorme gleba de terras à GE. Mas, infelizmente, não foi isto que aconteceu.
Durante o encontro, a única coisa que as autoridades universitárias queriam era a exclusão do campus universitário das normas de planejamento da cidade! Argumentaram, essas autoridades, que a UFRJ teria seu planejamento próprio – seu plano diretor exclusivo (ver especialmente pp 100 e seguintes), à parte de qualquer interferência dos poderes legislativos populares!
Lei exclusiva de “planejamento”
Como resultado da reunião na Câmara, e para que a UFRJ “concordasse” com o projeto de lei urbanístico para viabilizar a implantação do Centro Tecnológico da GE (com doação das terras públicas àquela multinacional), resolveu-se propor um projeto de lei de planejamento urbano que fosse estritamente dirigido à Ilha de Bom Jesus, excluindo-se todo o campus da UFRJ do planejamento urbanístico oficial da cidade.
Vale a pena ler (abaixo no leia +) a justificativa do novo projeto (substitutivo 1) que resume os fatos relatados, com a ressalva de que o que ali se resolveu não foi fruto de um consenso de todos os vereadores presentes; eu estava presente, e não concordei…
E assim foi feito, e aprovada a lei exclusiva de “planejamento” para a General Electric, e para a eventual outra empresa “verde” que irá se beneficiar da nossa ex-pública, ex-bucólica e ex-histórica Ilha de Bom Jesus.
E ainda se surpreendem que a Cidade não tenha nem planejamento, nem infraestrutura! Surpresos de quê, se isso acontece no coração da UFRJ, um centro de excelência do conhecimento?
JUSTIFICATIVA – substitutivo 1 ao plc 66/2011 – Ilha de Bom Jesus
“O presente Substitutivo é fruto do consenso alcançado na reunião de 27 Vereadores com os representantes da Reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro, realizada no dia 19 de novembro de 2011 e atende às conclusões decididas nessa reunião.
Nele, são estabelecidos os parâmetros urbanísticos somente para a área da Ilha do Bom Jesus que permitirão a implantação do Centro Tecnológico de pesquisas e treinamento do grupo econômico da General Electric do Brasil Ltda.
Assim sendo, contamos com o apoio dos senhores Vereadores para a rápida aprovação do presente Substitutivo.”
Você é fundamental para bem informar e seguir como elemento transformador em nossa sociedade brasileira, porque aqui se faz , reflete em todo o Brasil. Vamos á luta ainda mais quando sabemos destas ” manobras”! Argh!!
Obrigada pela força, Carmen. Abs SR
Obrigada pelos comentários, Juliana e Arlinei. E por terem compreendido bem que não somos contra os Centros de Tecnologia, mas à forma que eles são negociados, e seus custos, especialmente ambientais, urbanísticos e fundiários por nós pagos!
Excelente texto.
Boa tarde
Obrigado pela informação, o que nos passam é que o Rio de Janeiro está se tornando um polo de excelência tecnológica com vários centros de pesquisa sendo construídos além dos já existentes.
Só que preço não deve ser feito na contramão da Lei.
Abraço, saúde, sabedoria e $uce$$o