Prefeito quer um cheque em branco: operação urbana em Niterói

Niterói: o novo prefeito da cidade (PT) aceita modelagem de empreiteiras para financiar obras de embelezamento no Centro.

Isso foi o que ficou dito, nas entrelinhas, em duas audiências públicas realizadas nesta semana * (1), acerca do projeto de lei 143/2013, enviado pelo Executivo à Câmara de Vereadores de Niterói, em regime de urgência.

O referido projeto de lei, copiando o modelo do Porto “Maravilha”, pretende usar o instrumento urbanístico denominado Operação Urbana Consorciada, previsto nos artigos 32 a 34 *(2) do Estatuto da Cidade (ECi), para realizar o negócio urbanístico. A previsão é que, com a venda de todo o potencial construtivo da área que engloba cinco bairros * (3), a Prefeitura capte R$ 1 bilhão.

O que ela vai fazer com esse dinheiro, quando e como, isso o projeto de lei não diz.  Mas deveria, pois não condiz com o momento atual – de transparência e de  busca de retidão política – autorizar, via legislativa, a venda do patrimônio fundiário municipal, consubstanciado nos títulos de potencial construtivo (CEPACs), sem nenhuma previsão legislativa de em quais obras serão revertidos esses recursos.

 A lei do Porto “Maravilha”, da qual a proposta de lei para o Centro de Niterói pretende ser um espelho não é, definitivamente, um exemplo nem de bom urbanismo, nem de operação financeira com planejamento e controle social.  

No Rio, Prefeitura quis colocar no bolso, de uma só vez e num só governo, todo o dinheiro proveniente da venda da totalidade dos recursos urbanísticos da área (CEPACs). Para tanto propôs um pseudo leilão.

Sabendo que não teria concorrente privado interessado na jogada, tratou com o Governo Federal de usar o FGTS dos trabalhadores para formar um fundo imobiliário especial na Caixa para arrematar todos os CEPACs.

A CEF (os trabalhadores) bancou e a Prefeitura já não controla a venda dos CEPACs!  

Agora, todo o dinheiro é repassado ao consórcio de empreiteiras denominado Porto Novo ,que ganhou a licitação para realizar toda e qualquer obra na área – pequenas, médias, grandes e megas …

Será que a mesma operação vai se repetir em Niterói?  Não sabemos, pois os estudos e o cronograma de viabilidade econômico financeiro não são apresentados.  

Quem os têm?  As empreiteiras que fizeram a modelagem?  Quais foram ?  Será que elas serão as mesmas que ganharão a licitação para realizarem as obras de embelezamento na área?

Como no Porto, o projeto de lei de operação urbana de Niterói não tem qualquer ligação com plano diretor da cidade.Mesmo porque Niterói tem um Plano Diretor de 1992, que não foi refeito como manda o ECi.

Este foi apenas foi modificado para introduzir novos instrumentos urbanísticos, como a Operação Urbana Consorciada e outros, em seu texto. Nenhuma revisão de conteúdo foi realizada.

Então, pergunta-se: é legítimo que se realize uma operação urbana na Cidade utilizando-se de instrumentos inovadores do ECi, sem antes cumprir a obrigação urbanística de rever o Plano Diretor, como preconiza o artigo 40 §3º da mesma lei federal (ECi)?

Claro que não, pois seria fraudar as diretrizes conceituais do próprio Estatuto da Cidade.

É lamentável que um novo governo municipal do PT em Niterói – mesmo partido que criou o Ministério das Cidades – repita, em Niterói, erros e equívocos tão lamentáveis em planejamento urbano, como os que fez o governo do PMDB na Cidade do Rio. É se igualar pelo pior! 

* (1) – 1ª audiência realizada no Instituto de Arquitetos do Brasil – RJ, nesta segunda-feira, dia 15 de julho / 2ª audiência realizada na Câmara Municipal de Niterói nesta terça-feira, dia 16

* (2) – Das operações urbanas consorciadas

Art. 32. Lei municipal específica, baseada no plano diretor, poderá delimitar área para aplicação de operações consorciadas.

§ 1o Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.

§ 2o Poderão ser previstas nas operações urbanas consorciadas, entre outras medidas:

I – a modificação de índices e características de parcelamento, uso e ocupação do solo e subsolo, bem como alterações das normas edilícias, considerado o impacto ambiental delas decorrente;

II – a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas em desacordo com a legislação vigente.

III – a concessão de incentivos a operações urbanas que utilizam tecnologias visando a redução de impactos ambientais, e que comprovem a utilização, nas construções e uso de edificações urbanas, de tecnologias que reduzam os impactos ambientais e economizem recursos naturais, especificadas as modalidades de design e de obras a serem contempladas. (Incluído pela Lei nº 12.836, de 2013)

Art. 33. Da lei específica que aprovar a operação urbana consorciada constará o plano de operação urbana consorciada, contendo, no mínimo:

I – definição da área a ser atingida;

II – programa básico de ocupação da área;

III – programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada pela operação;

IV – finalidades da operação;

V – estudo prévio de impacto de vizinhança;

VI – contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e investidores privados em função da utilização dos benefícios previstos nos incisos I e II do § 2o do art. 32 desta Lei;

VI – contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e investidores privados em função da utilização dos benefícios previstos nos incisos I, II e III do § 2o do art. 32 desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 12.836, de 2013)

VII – forma de controle da operação, obrigatoriamente compartilhado com representação da sociedade civil.

VIII – natureza dos incentivos a serem concedidos aos proprietários, usuários permanentes e investidores privados, uma vez atendido o disposto no inciso III do § 2o do art. 32 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.836, de 2013)

§ 1o Os recursos obtidos pelo Poder Público municipal na forma do inciso VI deste artigo serão aplicados exclusivamente na própria operação urbana consorciada.

§ 2o A partir da aprovação da lei específica de que trata o caput, são nulas as licenças e autorizações a cargo do Poder Público municipal expedidas em desacordo com o plano de operação urbana consorciada.

Art. 34. A lei específica que aprovar a operação urbana consorciada poderá prever a emissão pelo Município de quantidade determinada de certificados de potencial adicional de construção, que serão alienados em leilão ou utilizados diretamente no pagamento das obras necessárias à própria operação.

§ 1o Os certificados de potencial adicional de construção serão livremente negociados, mas conversíveis em direito de construir unicamente na área objeto da operação.

§ 2o Apresentado pedido de licença para construir, o certificado de potencial adicional será utilizado no pagamento da área de construção que supere os padrões estabelecidos pela legislação de uso e ocupação do solo, até o limite fixado pela lei específica que aprovar a operação urbana consorciada.

 * (3) – Centro, São Lourenço, Gragoatá, São Domingos e Boa Viagem

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4 Resultados

  1. Nome*eloisa disse:

    só lamento o desmando generalizado que toma conta do nosso município. estamos órfãos. meia duzia de 3 vereadores lutam sozinhos contra a máfia articulada com os grandes empresários do setor imobiliário. transparência é a tônica.

  2. Ricarda Tavares disse:

    Como professora da Escola de Arquitetura e Urbanismo da UFF, que vem participando dos debates e audiências públicas em torno deste Projeto de Lei, também agradeço a adesão da profa. Sônia Rabello a mais esta causa cidadã.

  3. O IAB Leste Metropolitano agradece a contribuição da Sonia Rabello neste importante debate para a cidade de Niterói e para a Região Metropolitana do Rio de Janeiro!

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